É
hora de pressão total em deputados e senadores para a votação da PEC que institui, de modo cabal e irretocável, a prisão em segunda instância. Pressão, pressão e
mais pressão dos pagadores de impostos (que também votam) é a única linguagem
que parlamentares entendem. Em tempos digitais a pressão está ao toque dos
dedos.
Enquanto
isso, delicie-se com mais um artigo de J.R.Guzzo, publicado hoje.
CONTRA
O IMPÉRIO DA LEI.
José Roberto
Guzzo, O Estado de S.Paulo
10 de novembro de 2019 | 03h00
Este
é o novembro do nosso descontentamento diante de um Brasil que está em guerra
aberta contra os brasileiros. Agora, depois de meses a fio de uma tragédia
única no mundo, vemos a maioria dos magistrados do tribunal supremo do País
fazerem o oposto do que é a sua obrigação. Em vez de buscarem mais justiça numa
sociedade que já é perigosamente injusta, chamaram para si a tarefa de dar aos
criminosos ricos, aqueles que têm dinheiro para pagar escritórios milionários
de advocacia penal, o direito de passarem o resto da vida sem receber nenhuma
punição real pelos crimes que praticaram.
Não fazem isso porque
acreditam, como dizem, que o direito de defesa deve estar acima de todos os
outros - a começar pelo direito de suas vítimas. Fazem porque estão metidos numa
luta desesperada pela sobrevivência do Brasil velho. Você sabe que Brasil é
este - corrupto, subdesenvolvido e desigual, paraíso dos parasitas da máquina
pública, da venda de favores e dos privilégios para quem tem força, inimigo do
trabalho, do talento e do mérito individual. É o País que você tem certeza que
não quer.
Nada destrói tanto o respeito
pelos governos, dizia Einstein, do que a sua incapacidade de fazer com que as
leis sejam cumpridas. É o risco que foi construído no Brasil. De fato, como
seria possível respeitar o poder público neste País se o Código Penal
brasileiro diz que é proibido praticar crimes, mas o STF decide impedir a
punição dos crimes praticados? Na verdade, o que realmente aconteceu em toda
essa infame discussão sobre a “prisão em segunda instância” não foi, em momento
algum, uma divergência sobre questões jurídicas. Esqueça as questões jurídicas.
O
que houve à vista de todos, isso sim, foi um choque entre lei, ou o que nos
dizem que é a lei, e moral. Quando a lei se opõe à moral, como nesse caso, ou
se perde o senso moral ou se perde o respeito pela lei. Não há outra
possibilidade. É o momento em que a lei se torna injusta, por não estar mais em
harmonia com as noções elementares do certo e do errado. O resto é
mentira.
O que o cidadão viu, neste
golpe legal para proibir a prisão de condenados em segunda instância, foi uma
tentativa aberta de impedir que vigore no Brasil o império da lei - algo que só
pode existir se a Justiça for imparcial. Mas quem defende essa aberração, inexistente
em qualquer país sério do mundo, propõe, na verdade, que o sistema judicial
brasileiro tome um partido - o dos réus, por considerar que as provas colhidas
contra eles jamais estarão corretas, ou serão suficientes, e que os juízes
errarão todas as vezes em que condenarem alguém.
Trata-se, simplesmente, de
usar o que está escrito na lei para desrespeitar a lei. Sempre ouvimos que
democracia e civilização só podem vigorar se a Justiça tiver coragem de
enfrentar o grito irracional da multidão, que exige culpados, não se interessa
por provas e não entende de hermenêutica. Mas não há nada de irracional na voz
da multidão que se está ouvindo agora - muito pelo contrário. O brasileiro sabe
perfeitamente que um réu, para acabar na cadeia, tem de ser condenado por um
juiz, a “primeira instância”.
Em seguida precisa ser
condenado outra vez - agora não mais por um, mas por um conjunto de
magistrados, a “segunda instância”. Nos dois casos, ele tem todas as chances de
se defender e, se não consegue, não pode ficar apelando na Justiça até o Dia do
Juízo Final. Irracional é querer o contrário. Não há nada de frouxo na
moralidade, como alegam os campeões do “direito de defesa”. Na verdade, ela é
muito mais dura que qualquer lei. Diz apenas que é
preciso fazer a coisa certa.