Talvez você, caro leitor, não tenha idade para se lembrar de
uma das mais bem sucedidas campanhas de marketing educativo que o país já teve.
Criada pelo publicitário Ruy Perotti nos anos setenta do século passado um personagem amante da sujeira , apelidado
de Sujismundo, era ridicularizado pela desfaçatez com que colocava em prática
seus grotescos hábitos higiênicos. O tema da campanha era “Povo desenvolvido é povo limpo”.
Já entramos na segunda década do século 21 e quase nada
mudou. Estive no Rio de Janeiro durante esse carnaval, mais especificamente no
mundialmente famoso bairro de Ipanema. A viagem de metrô entre o Flamengo e o
bairro da garota que balança a caminho do mar já prenunciava o que estava por
vir. Estações sujas, escadas rolantes quebradas, trens mal cuidados
adequadamente a serviço de uma população viciada em atirar todo o tipo de lixo
à distância em que seu braço alcança. Experimentar uma corrida de obstáculos em
um campo minado seria menos perigoso e estressante do que percorrer o trajeto
entre a estação de chegada à praça General Osório - a principal do bairro.
Não é de hoje que o país tem uma relação psicótica entre o
público e o privado. O povo apenas repete, em múltiplas variações, aquilo que
lhes é incutido pelo exemplo das gangues governamentais que se apropriam dos bens
e do dinheiro público como se deles tivessem direito consuetudinário. E dá-lhe
cozinha a céu aberto, monturos de isopor obstruindo calçadas, ambulantes
belicosos mercadejando adereços carnavalescos e claro, consumidores em estado
de selvageria terminal usando as ruas como se cloacas fossem.
A música do Gil diz que o Rio de Janeiro continua lindo. Só
se for vislumbrado da janela de algum avião. Visto da perspectiva de um
automóvel o turista que percorre o
trajeto do aeroporto internacional à zona sul tem a impressão que aterrissou
por engano em algum sítio de guerra do Burundi. Ruas imundas, construções
decadentes compõem um cenário soturno que em nada lhe remete aos luminosos
cartões postais que constituem a identidade icônica da cidade.
Fico imaginando a impressão que o entorno dos bairros ricos e
que são passagem obrigatória para os que chegam à Cidade Maravilhosa causam nos
espíritos dos que possuem algum apreço, por mínimo que seja, pela ordem, limpeza e estética
urbana.
Os administradores da cidade desejam causar uma boa impressão
aos visitantes que aqui chegarão para os Jogos Olímpicos de 2016. Isso é
remotamente possível para os que entrarem na cidade via Galeão. Melhor do que
investir bilhões em obras cosméticas de eficácia duvidosa teria sido usar o
dinheiro para uma faxina geral e urbanização minimamente digna para as
populações que habitam essas áreas historicamente degradadas e que
transformaram o entorno da cidade em uma paisagem desoladora e deprimente.
Claro que há outras soluções. Uma delas seria construir um
túnel que levasse o visitante diretamente do Aeroporto do Galeão à Zona Sul.
Outra seria presenteá-los com óculos geradores de paisagens virtuais que
transformassem favelas em belos condomínios e lixo em jardins. Nestes tempos de
Google Glass, nada é impossível...